quarta-feira, 29 de outubro de 2008
Eu quero um samba feito só pra mim?
Em alguns idiomas "ser" e "estar" são expressos através do mesmo verbo. As palavras que compõem um idioma dizem muito sobre como construímos os conceitos na nossa cabeça, qual a dimensão que damos as coisas, qual o espaço mental que temos para ampliar nossa compreensão dos fatos, do novo, do diverso... já disseram até que só é possível filosofar em alemão.
Bem, em português, "ser" e "estar" são verbos diferentes..., como já sabemos... rss. E de fato são coisas diferentes. Você não "é", automaticamente, só por que "está"... e vice-versa.
Ai, ai... tudo isso só por que eu queria falar sobre a relação entre estar no mundo e fazer parte dele.
Na verdade, queria chegar num ponto mais específico: guetos.
Essa palavra sempre vem a minha cabeça quando recebo alguma propaganda, leio alguma notícia, etc, a respeito de algo feito, criado ou dirigido especificamente para um grupo de pessoas com algo em comum, geralmente por alguém que tem esse "algo em comum"... ou não.
No âmbito pessoal, é, ou seria, bastante lógico e até saudável, você concluir que, para existir integralmente, é interessante que você se destaque, se diferencie. Mas, quando pensamos em grupos, é bem esquisito verificar que, às vezes, para fazer parte, ou para conseguir sobreviver, você tem de se separar.
Assim, nossotros gays, por exemplo, criamos, lugares específicos, revistas específicas, livros, serviços, roupas, linguagem, etc etc e mais infinitos eteceteras. Falamos de nós para nós mesmos. Somos como somos para nós mesmos. Pra geral, só estereótipos e clichês.
Antes de qualquer coisa, sempre é mais do que bom lembrar que nada é bom ou mau em si, certo? Tudo depeeeende. Isso sem falar que nada é SÓ bom ou SÓ mau.
Mas será que o que nos protege, "liberta" e fortalece, num primeiro momento, não acaba por nos empurrar cada vez mais para um nicho periférico: os diferentes (na melhor das hipóteses)?
Sem dúvida temos nossas necessidades específicas. Sem dúvida união é imprescindível, unidade é fundamental e ter um objetivo, uma direção, é o ideal, principalmente nesse mundo hostil a quem não se enquadra nos padrões artificialmente construídos que nos são impostos e nos submete a todo tipo de violência e preconceito.
Necessidade de discutirmos, trocarmos experiências e vivências, descobrirmos qual é a nossa identidade, nos reconhecermos no semelhante, construirmos nossos valores e nossa história com dignidade e respeito, tudo isso é urgente!
Mas falarmos sobre nós para TODOS tem um efeito muito mais transformador, revolucionário e eficaz no que se refere à inclusão e naturalização.
Assim, nos unirmos para produzir a informação é mais do que bem-vindo e inteligente, é uma questão de sobrevivência. Mas nos dirigirmos APENAS aos "iguais" surte, em pouco tempo, o efeito da segregação.
Isto posto, acho que vale a pena a reflexão.
O que não podemos é criar um molde de como as coisas devem ser, fazer tudo a partir desse molde e desligar o raciocínio. Cada problema tem a sua solução e, PRINCIPALMENTE, seu jeito de ser resolvido.
Afinal, eu quero um samba feito só pra mim?
Eu quero um samba
(Haroldo Barbosa e Janet de Almeida)
Eu quero um samba feito só pra mim
Eu quero a melodia feita assim
Quero sambar porque no samba eu sei que vou
A noite inteira até o sol raiar
Ah! Quando o samba acaba, eu fico triste então
Vai melancolia, eu quero alegria dentro do meu coração
Ah! Quando o samba acaba, eu fico triste então
Vai melancolia, eu quero alegria dentro do meu coração
Eu quero um samba feito, um samba feito só pra mim
Eu quero a melodia feita assim
Quero sambar porque no samba eu sei que vou
A noite inteira até o sol raiar
Para ouvir:
http://www.mp3tube.net/br/musics/Joao-Gilberto-Eu-Quero-um-Samba/198171/
sábado, 4 de outubro de 2008
A Importância do Conteúdo
Interessante a natureza, né? Nada é totalmente bom ou mau. Para cada vantagem existe uma desvantagem... e assim por diante. Assim é em relação a tudo, desde sempre. Um bom jeito de verificar isso é quando vemos uma determinada atividade se transformando. O que sempre foi de um jeito, por um motivo qualquer, como tecnologia, por exemplo, começa a adquirir novas formas, novos espaços, se torna acessível, ao alcance de todos. Estamos assistindo isso com a comunicação em todas as suas dimensões. E o grande agente transformador, logicamente, é a Internet.
Parênteses. Estava aqui me lembrando de todas as transformações tecnológicas das quais fui testemunha e me lembrei do seguinte: no meu primeiro dia de escola, minha mãe, percebendo que eu não estava nem um pouco feliz com a aquilo, me deu um apontador no formato de um telefone, um telefonezinho verde, e me disse que, qualquer coisa, eu podia ligar pra casa. Hum... hoje, provavelmente, eu levaria meu celular e, certamente, ligaria pra ela cinco minutos depois dela virar a esquina, tipo "me tira daquiiiiiiii!!!!!". Fecha parênteses.
Mas o que tem me chamado a atenção nessa historia toda de tecnologia, e mais objetivamente Internet, é o que ela tem feito com a informação, que, como todos sabemos, é também sinônimo de "poder".
Tornar a informação acessível a todos é bacana. Sem dúvida! Tornar acessível a qualquer um produzir informação é bacana também. Porém, isso envolve uma série de questões e riscos que podem não ser nada bacanas.
Sem ter a intenção de ser chata, o que eu quero propor é uma reflexão. E felizmente não estou sozinha. Por algum fenômeno, "lei da atração", inconsciente coletivo, tenho esbarrado em entrevistas, textos, matérias que corroboram com minhas sensações sobre a qualidade da informação presente na Internet e, mais, sobre como esse veículo tem se tornado um grande facilitador na propagação de "informação". E é justamente por isso que os critérios na utilização desta ferramenta precisam ser cada vez mais considerados.
Isto posto, gostaria de compartilhar com vocês a entrevista que a jornalista Lucia Guimarães concedeu ao "Caderno 2" do jornal "O Estado de São Paulo" e que está na edição de hoje (04/10/2008).
Reflitamos, pois:
"Tecnologia criou crise de conteúdo''
Na era do blog, não se pode abdicar da consistência cultural, diz Lúcia Guimarães, que estréia segunda-feira nesta página
Ubiratan Brasil
Lúcia Guimarães sempre gostou de enfrentar desafios. E os mais recentes chegam quase simultaneamente: amanhã, ela se despede, ao vivo, do programa Manhattan Connection, que ajudou a criar e há 16 anos é exibido pelo canal por assinatura GNT. E, na segunda-feira, ela inicia sua colaboração com o Estado, publicando quinzenalmente uma coluna no Caderno 2, revezando com Matthew Shirts.
Nascida no Rio de Janeiro, Lúcia vive em Nova York desde 1985. Lá, exerceu diversas funções (editora internacional da Rede Globo, redatora do Jornal Nacional, produtora do jornalista Paulo Francis), mas sempre preocupada com o viés cultural. Em Nova York, centro criador de grandes tendências que se espalham pelo mundo, Lúcia desenvolveu um faro raro para o que é realmente cultural, e não apenas modismo descartável.
Esse é o assunto, aliás, de sua primeira coluna, em que comenta os 40 anos da New York Magazine, revista que separa o joio do trigo entre o turbilhão de novidades culturais produzidas na cidade. Com esse texto, Lúcia retoma o hábito de comentar e noticiar o que realmente acontece em Nova York para o Estado - em 1997, ela participou do Manhattan Connections, crônicas que eram publicadas no então Caderno 2 Especial Domingo, ao lado de Lucas Mendes, Caio Blinder e Nelson Motta. Sobre o retorno, ela respondeu às seguintes questões por e-mail.
Que tipo de assuntos você pretende tratar em sua coluna no Estado??
Em Nova York, pode-se cobrir grandes eventos culturais ou usar a âncora da cultura local para discutir idéias, comportamento. Então, espero poder circular nesse território, seja destacando um evento ou fazendo o perfil de protagonistas culturais ou escrevendo sobre temas que nos interessam no Brasil, usando a experiência local.
Aliás, qual é o tema da primeira crônica?
São os 40 anos da revista New York, que lançou uma edição especial com mais de 300 páginas. Agora sob o comando de Adam Moss, publica uma seleção sobre o que é brilhante e desprezível na alta e baixa cultura. Diferentemente da New Yorker, que tem uma reputação mais literária, a New York Magazine preocupa-se com tendências.
Qual deve ser hoje a função das crônicas que os jornais publicam?
Acho importante distinguir entre colunista e cronista. O cronista é literário e atemporal. O colunista é tópico e opinativo. Espero não ser auto-indulgente com o privilégio de ter um espaço para opinião. Espero ter o talento para transformar flagrantes mundanos, apesar de distantes geograficamente do leitor do Estado, em uma crônica.
Você acredita que um cronista celebra as vantagens das experiências pequenas e corriqueiras?
Sim, eu sou fã da revista mais bem escrita do mundo, a New Yorker, e acredito que uma boa história bem contada, por mais obscura ou corriqueira, pode capturar a imaginação do leitor.
Até que ponto um cronista pode (ou deve) ser um provocador?
O colunista pode ser um provocador, o cronista é um estilista. Mas nós estamos encharcados de polarização ideológica e de narcisismo editorial. A mídia americana e, infelizmente, cada vez mais a brasileira, está cheia de dardos à procura de alvos. Isso empobrece a polêmica. O polemista tem sido substituído pelo poseur.
Atualmente, com o crescimento do número de blogs, qual o perigo de a crônica em jornais desaparecer?
Não tenho como avaliar isso, mas é claro que os jornais estão enfrentando um enorme desafio. Como a necessidade é a mãe da invenção, já vejo soluções híbridas que acomodam as mudanças tecnológicas. O que eu acho importante é, depois desse período de susto, que os editores e as pessoas com poder de decisão aplaquem o instinto populista que tenta igualar qualquer pessoa com acesso ao teclado do computador. Paginar um grande articulista online ao lado de uma enxurrada de comentários inconseqüentes ou preconceituosos dilui a importância das idéias do artigo e não eleva o discurso das pessoas que querem se expressar. Não há nada errado com hierarquia. Especialmente agora, quando qualquer pessoa pode ter o seu blog, é importante as empresas de mídia não abdicarem do seu valor, da sua consistência editorial. A tecnologia criou não só uma explosão mas também uma crise de conteúdo.
Link original paara a matéria: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20081004/not_imp253096,0.php
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